9 de outubro de 2009

Enfermeiros vs morte [mais que amor]


Numa altura em que a nossa profissão tem sido esquecida e deixada para trás, como que a relembrar o estado em que está a "saúde" do nosso sistema de saúde e a nossa própria saúde, li um artigo que, curiosamente, foi escrito por um amigo e ex-colega meu que, aborda uma questão tão controversa como a nossa relação, enquanto profissionais de saúde, com a morte. Espero que gostem... (Fiz uma selecção do texto porque era muito grande para publicar no blog)


"A crescente valorização da vida a que actualmente se assiste dota os cuidados paliativos de uma debilidade e fraqueza preocupante e assustadora. Seja nos lares, instituições de apoio ou hospitais, a atenção ao doente terminal tende a ser descurada, sendo ultrapassada por toda uma panóplia de técnicas que hoje se acredita prolongarem a vida.
E estaremos nós a ser coagidos por uma sociedade que apenas aposta na quantidade ao invés da qualidade? E essa qualidade não estará a ser dirigida apenas para aqueles que tem a possibilidade de cura?O cuidar para a morte assusta e constrange o mundo mas também a nós, profissionais de saúde, porque também fazemos parte desse mundo.
Feliz ou infelizmente, o homem tem essa capacidade de pensar para viver de forma mais confortável ou talvez mais segura. E se à felicidade foi atribuído um valor ou conotação positiva, a morte não teve a mesma sorte. E o que é lamentável é que essa falta de sorte que recaiu sobre o termo arrastou dificuldades em lidar com ela e com a sua representação.
A certeza de que as pessoas em fase terminal necessitam de apoio existe. No entanto, essa certeza é ofuscada pelo medo de não ser capaz de lidar com a morte. Tememos ser incapazes de ver a degradação física e mental do doente, de presenciar as dificuldades que progressivamente se espelham aos olhos de cada um, de ter de lidar com a dor e com a sensação de inutilidade daquilo que é feito, pois o fim existirá a curto ou médio prazo.
Todas estas são questões que afastam muitos profissionais. Que afastam não, talvez que apenas seleccionam os que foram capazes de derrotar os estigmas e preconceitos que a sociedade lhes procurou impelir, daqueles que foram incapazes de fazê-lo e que hoje vêem a morte como os comuns.
Essa selecção, que Darwin expressaria como natural, ainda que noutro contexto, aplica-se na perfeição e une-nos a uma série de profissionais que acredita que vale a pena cuidar (...) E vale a pena porque é minimizador da dor física, mas também da maior dor, a da alma. Vale porque somos capazes de dar a mão e receber um pequeno aperto.
E é de facto o amor que rima com os cuidados paliativos e que os move. Sem ele não existiriam profissionais a lutar para proporcionar só mais um sorriso, não existiriam doentes a agradecer pela oportunidade de viver só mais um dia (...)
Sem o amor não faria sentido falar sequer em cuidados, nem em cuidar, nem em curar, nem em profissionais de saúde, nem em conduta, nem em vida, nem em morte... (...)"

[Obrigado Ângelo e Alexandra pelas vossas tão sábias palavras, que faço delas minhas...]

Então, por favor, não me venham (as pessoas, a sociedade) dizer que tenho que me distanciar dos meus doentes... Que estranha forma de amor e de amar seria essa, longe (ainda que "apenas" psicologicamente)?
Para evitar que eu sofra?
Que enfermeiro é esse que não sofre? Não é enfermeiro...

A todos os meus colegas que partilham da minha opinião, a todos aqueles que são verdadeiros enfermeiros...

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